sábado, 11 de julho de 2009

O Palhaço e a Rosa parte5


Ainda tinha água nos ouvidos da travessia do rio e o vento frio da manhã cortava seu rosto sussurrando coisas em seu ouvido, como quem atiça uma confusão o vento soprava IRA, ainda por cima tinha o som da correnteza mais forte que nunca naquele dia, o que lhe dava mais raiva, os girassóis nunca haviam aplaudido uma de suas apresentações como aplaudiam as palavras daquela invasora.

Mesmo com todo aquele barulho ele podia distinguir aquela voz hipnotizante, sempre foi ótimo em separar sons, desde a infância tinha a fixação pela sonoridade das coisas a sua volta, sempre quando chegava a um lugar novo fechava os olhos por alguns minutos e deixava a melodia do universo invadir seu coração, com todos seus músicos distraídos e sempre muito ocupados para perceber a magia das notas que se propagavam de seus movimentos, palavras e gestos. Tudo virava um instrumento naqueles minutos mágicos, o ritmo dos passos apressados, as vozes da multidão formando um coro, o sino do carrinho de pipoca marcando a virada da melodia.

Seu lugar favorito para ouvir a orquestra dos distraídos ,como costumava chamar, era a praia, não existe lugar mais sonoro no mudo que uma bela praia, o som dos pés pisando na areia fofa marcando o tempo da melodia, as gaivotas que pra ele se assemelhavam a os violinos emitindo um agudo sedutor, e o principal de todos: O mar, a prova fiel que o mundo é uma orquestra, com o ritmo constante das ondas quebrando na praia, dizia sempre: "O Mar é a batuta de Deus regendo de forma impecável o universo formando a mais bela das sinfonias: A Infinita Sinfonia do Universo."

Era uma pena só ele perceber toda aquela beleza, para as pessoas a sua volta tudo aquilo era barulho, um caos sonoro, sem ritmo nenhum, mas ele podia filtrar os sons e assim conseguir perceber a infinidade de canções que se formavam.

E era graças a isso que ele podia distinguir as palavras ditas pela invasora naquela manhã, eram de uma rima e tonalidade semelhantes a declamação de uma poesia, ele só não conseguia saber de onde vinha o som e ainda não tinha tomado coragem para ir até o meio do campo de girassóis para ver quem estava tomando pra si o único lugar em que ele se sentia completo.

Até que o vento lhe soprou outra vez aos ouvidos: “e se fizeram alguma coisa com Rosa?!” aquilo era demais para ele, na mesma hora esqueceu-se do medo e pôs se a correr em direção ao centro do campo se esgueirando por entre o emaranhado de galhos e raízes, e numa passada em falso tropeçou em uma raiz e caiu de cabeça em uma pedra, tentou se levantar sentiu uma gota escorrer até seu peito, pensou que já estava seco por ter passado tanto tempo no sol e no vento, ao levar as mãos na cabeça pode ver, era sangue, nunca havia visto tanto sangue na vida, no mesmo instante viu tudo escurecer e desmaiou.

Sentiu algo o puxando, inconsciente, mas mesmo assim podia sentir uma sensação de impotência, não poder se mover, pensamentos perdidos em sua cabeça, desespero, medo. Só conseguia sentir o toque delicado ao mesmo tempo zeloso em sua pele e ouvir alguns sons, o som de pano rasgando e uma voz dizendo “você vai ficar bem, vou cuidar de você” aquele timbre de voz trazia consigo uma paz, estava deitado embaixo da roseira com a cabeça no colo macio de alguém, com o pouco de força que ainda lhe restava balbuciou as únicas palavras que vinham na sua cabeça naquele momento:

- Rosa...?

E então a voz doce respondeu

- esse é meu nome...

E continuou falando, mas ele não conseguia mais distinguir nem assimilar nenhum som naquele momento

Então no seu ultimo ato antes de apagar completamente, abriu seus os olhos e num flash viu o sorriso mais lindo e surreal que já havia visto na vida, aquela imagem ficou registrada na sua mente como fotografia. Foi tudo o que conseguiu ver: um lindo sorriso e covinhas ainda mais charmosas e desmaiou em seguida.

Aquele sorriso surreal no meio de todas aquelas rosas misteriosas...